

Descortinando a Arteterapia em homenagem ao Dia do Arteterapeuta
(...) Nesse texto, optei por tentar esclarecer um pouco o que é Arteterapia e o que é preciso para formação de arteterapeutas, pois acredito que a área ainda é um tanto desconhecida para grande parte da população e isso acaba gerando alguns estranhamentos e confusões.
Eu mesma cheguei até ela por conta das inquietações e dúvidas que comecei a ter. Sou psicóloga de formação e a arte sempre fez parte da minha vida e da minha profissão. Seria eu então uma arteterapeuta? Com esse questionamento, participei de um curso introdutório para entender melhor essa prática e responder essa pergunta. Descobri que não era (ainda) arteterapeuta, mas me apaixonei pela área e fui me especializar. (...)
Sou psicóloga/psicólogo de formação e a arte sempre fez parte da minha vida e da minha profissão. Seria eu então uma/um arteterapeuta?
Não. Neste caso, você é uma/um psicóloga/psicólogo que se utiliza da arte como uma ferramenta de trabalho. A Arteterapia é uma Especialização e, portanto, é necessária uma formação específica com estrutura teórico-vivencial para que possamos atuar. A formação é baseada na interface entre a psicologia, a arte, a arteterapia e a metodologia científica, uma formação exclusiva que prevê tanto a teoria, quanto a vivência do processo e a prática supervisionada. Para que a formação seja adequada e reconhecida, é muito importante que ela siga os parâmetros da UBAAT (União Brasileira de Associações de Arteterapia). Dessa forma, recomendo que os interessados observem esse aspecto e pesquisem no site da UBAAT os cursos reconhecidos antes de iniciarem seus estudos.
Somente psicoterapeutas podem se especializar em Arteterapia?
Não. Por ser uma especialização, não é uma área exclusiva de psicoterapeutas. Essa é uma pergunta que sempre me fazem. Tenho colegas engenheiras, administradoras, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, arte educadores, artistas plásticos, médicas, biólogas, fotógrafas, pedagogas, entre tantas outras profissões. Cada um, dentro da sua área de formação, pode atuar com a Arteterapia. Segundo AATA (American Art Therapy Association), 2003, a atuação pode ocorrer em "serviços individualmente ou como parte de equipes profissionais, em contextos que incluem saúde mental, reabilitação, instituições médicas, legais, centros de recuperação, programas comunitários, escolas, instituições sociais, empresas, ateliês e prática privada."
O uso da arte em uma sessão terapêutica ou sequência de sessões é Arteterapia?
Ouço bastante sobre essa colocação, que o uso da arte em terapia já se caracteriza um atendimento arteterapeutico. Eu mesma, antes de procurar conhecer melhor a área, tendia a acreditar nisso, era uma das minhas inquietações. Mas não é verdade. Cada espaço tem sua intenção, sua metodologia, seu olhar. Artepsicoterapia, arteterapia, assim como arte educação, ensino de arte e grupos de arte são práticas diferentes. Cada atuação tem seu espaço específico e precisamos conhecer e reconhecer a importancia de cada uma delas e o espaço que elas ocupam. O foco do fazer arte é diferente para cada uma dessas práticas e são embasadas por abordagens teóricas específicas.
Existem diferentes abordagens na Arteterapia?
Sim. As principais são Abordagem Psicanalítica, Abordagem Junguiana e Abordagem Gestáltica. Porém, independente da abordagem de formação, a Arteterapia é caracterizada por um processo criativo e expressivo no qual a arte é a sua base terapeutica. Existe, dentro deste processo, uma relação arte-cliente-arteterapeuta que é essencial para o despertar de um fazer e expressar criativo, de uma percepção criativa e de um olhar criativo.
Quais linguagens são utilizadas na Arteterapia?
As artes plásticas (desenho, pintura, modelagem, colagem...) são as linguagens mais comumente encontradas nesses processos, mas também utilizamos as artes do corpo (dança, ritmo, movimento...), as artes da cena (teatro, clown, dramatização no aqui-agora), as artes têxteis (costura, bordado, tecelagem...), as artes audiovisuais, as artes sonoras e as artes literárias (escrita criativa, poesia, contos, contação de história...). Porém, mais importante que ter um leque de possibilidades de recursos e expressões artísticas para serem utilizadas nos atendimentos, é conhecer as características e propriedades terapêuticas de cada uma delas. É saber como o uso de cada material ou recurso expressivo pode impactar no processo ou na vida de quem está sendo atendido, quais as reverberações psiquicas envolvidas. A escolha do material utilizado na sessão não é aleatória, tem um propósito e, inclusive, a escolha equivocada de um material pode não ser benéfico para o atendimento. Na formação de Arteterapeuta, existe um olhar específico que esclarece o uso da arte em terapia e como esse uso auxilia no processo arteterapeutico. As escolhas de materiais e técnicas podem ser feitas a partir da análise do nível de interação com o material que a pessoa atendida (ou grupo) apresenta na sessão. Para nos auxiliar, temos o modelo do ETC (Continuum de Terapias Expressivas), de Lusebrink. Esse estudo é denso e fundamental.
Mas, Iara, fazer arte por si só já não é terapeutico? Precisa de tudo isso?
Sim, fazer arte livre e espontaneamente ou com técnicas pode ser terapeutico por si só, assim como fazer artesanato, conversar com outras pessoas, bordar, cozinhar, caminhar no parque, dançar... Há várias atividades que podem exercer uma função terapeutica para algumas pessoas e que trazem bem-estar. Mas isso não quer dizer que fazer arte é arteterapia ou, dando outros exemplos, conversar com outra pessoa é psicoterapia ou ouvir música é musicoterapia ou que dançar é dançaterapia. Existem técnicas e metodologias específicas para cada atuação, mesmo que se utilizem do mesmo recurso. Uma aula ou um grupo de bordado, por exemplo, pode ser terapêutico, mas não é o mesmo que utilizar o bordado como recurso arteterapeutico. Existe uma intenção e uma função diferentes nas atividades. Para participar da arteterapia ninguém precisa ter talentos artísticos, não precisa saber bordar, pintar, desenhar ou dançar, mesmo que sejam utilizados esses recursos artísticos nas sessões. Dito isso, ressalto que é fundamental reconhecer a importancia e o espaço que ocupa cada atividade e cada terapia. Na prática, a/o Arteterapeuta facilita e estimula a pessoa atendida (ou grupo) a se expressar criativa e artisticamente e a explorar a sua expressão. Facilita entrar em contato de diferentes formas com ela, olhar de diferentes perspectivas, dialogar, resgatar, transformar, (re)organizar, (re)ssignificar, (re)configurar, (re)integrar, buscar novos sentidos e, consequentemente, ampliar o conhecimento e a consciência de suas questões internas e as ressonâncias no mundo externo.
Como é o processo Arteterapêutico?
Quando eu mergulho no processo em um ateliê arteterapeutico, ele me impulsiona a expressar algo que emerge de mim e que eu materializo diante de mim. Muitas vezes, nosso fazer artistico está conectado mais fortemente às nossas sensações e emoções que ressoam no processo, sem que haja uma razão envolvida. A expressão não tem nenhuma intenção estética ou prevê qualquer julgamento. Eu costumo dizer que é um pedacinho de dentro da gente que olhamos do lado de fora, seja bi ou tridimensionalmente. E esse pedacinho pode nos surpreender, revelar muito de nosso mundo interno que desconhecemos no aqui e agora, que não trazemos à consciência, que habita um lugar escondidinho em nós. Ao enxergar essa expressão diante de mim, eu consigo traçar um diálogo com ela, o que impacta na reflexão do conteúdo acessado. É este o processo de expressão, percepção e olhar criativos. Mas isso não é uma receita. Não necessariamente ocorre nessa ordem, não necessariamente ocorrem todas essas etapas, não necessariamente ocorre em uma única sessão, não necessariamente verbalizo sobre o que vivenciei, não necessariamente me desligo da razão, não necessariamente a expressão é vista diante de mim, pode ser um gesto, pode ser um movimento, pode ser um som e pode ser que eu não o transforme em artes plásticas, por exemplo. O processo é único e, seja individualmente ou em grupo, o ritmo e o caminhar do processo a gente vai descobrindo e revelando no processo.
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